capítulo 014 ... um copo com o Susto
Este Susto é mesmo original, das fachadas que conheço, não há nenhuma que assuste menos e juntos, pela escavação a dentro, seguimos em direcção a uma taberna próxima, juntos com um ganido de um cachorro indigente, mal vestido que aromava uma das cinquenta e sete portas da betesga com mijo violeta, extraído do escaravelho bexigoso. Em poucos anos, formou-se uma fila de cadelas, não menos indigentes, bem vestidas, catando os insectos violeta para alimentarem as suas crias de fortuna não muito crente. Encostámo-nos no mármore, o lugar perfeito que me permite controlar a comunidade de esplanada recolhida, culpa do que se faz valer. Contudo, o seu espírito sentadino nunca morre e tudo é fiscalizado. A decoração é divertida, nas paredes brancas de cal figuravam salpicos vermelhos de sangue, rastos de carnificina e da tão antiga pólvora. Seria implacavelmente fantástico, a presença de pequenas porções de carne humana, devidamente maquilhada, desfacelada e em estado de decomposição, penduradas nestas divisões frias e sem um pouco de alegria. Vá lá, o palhaço desdentado entrou em cena oferecendo um pequeno período de vida a este tédio intrigante, a comunidade afoga-se em risinhos ensinados, o palhaço é mesmo palhaço. Ele abre a porta às comoções dos corações das intituladas damas, ao arrancar um dedo do pé, oferecendo-o a um mendigo esfomeado e reprimido pelas nuvens lacrimejantes, que por ali procurava a sua justiça. Não perdeu tempo, em segundos devorou o dedo, guardando a unha devidamente autografada, para mais tarde recordar.
As palhaçadas continuam, os fiscais aumentam o seu número, é um dos momentos auges, não fosse a desistência do bacano ser necessária para que o sangue seja estancado. O espetáculo continua, agora são os limões que saltam para a mesa, apresentando um bailado típico dos limoeiros, desviando a atenção de alguns comunitários, aplaudindo com o fogo de um dragão que por ali pescava minhocas para a caça.
Fartei-me. Saí pela escavação para entrar de novo no mundo, ao menos simples. O dia acabara de nascer, sem nuvens, libertando aos poucos a floresta de cacimba, criando reflexos espectaculares de uma estrela que nasce, tornando-se num dia prometedor. Decidi descansar, chegando o cú ao chão, vasculho o meu ninho e encontro o tabaco de enrolar, e fabrico calmamente um cigarro. Lentamente, vou-me inteirando da paisagem que me rodeia, em toda esta beleza, nas grandes árvores de cores invisíveis e completamente cobertas de lã, oferecendo-lhes um ar terno e meigo, aqui, num solitário afogado pelo silêncio.